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domingo, janeiro 02, 2011


O filme As Virgens Suicidas, com direção de Sofia Copolla, já havia me marcado muito. Aliás, se eu for falar da Sofia aqui e de toda sua sensibilidade para filmar, não paro tão cedo. Mas não foi até o meio do ano passado, mais ou menos, que eu descobri o livro e me apaixonei uma vez mais pela história. Deixo aqui, um dos trechos que eu mais amo da história.

“Isso tudo, porém, é como caçar o vento. A essência dos suicídios não consistia em tristeza ou mistério, mas em simples egoísmo. As garotas apossaram-se de decisões que é melhor deixar entregues a Deus. Tornaram-se poderosas demais para viver conosco, preocupadas demais consigo mesmas, visionárias demais, cegas demais. O que arrastavam atrás de si não era a vida, que é sempre vencida pela morte natural, mas a mais trivial lista de fatos mundanos: um relógio na parede marcando seu tique-taque, um quarto em penumbra no fim da tarde, e a afronta de um ser humano pensando apenas em si mesmo. Seu cérebro apagando-se para o resto, mas chamejante em exatos pontos de dor, feridas pessoais, sonhos perdidos. Todas as pessoas amadas retrocedem como se afastadas sobre uma grande superfície de gelo, reduzidas a pontos pretos que agitam os braços e já não se ouvem. E então a corda lançada por cima da viga, os soníferos despejados na palma da mão onde a linha da vida é longa e mentirosa, a janela aberta, o forno ligado, qualquer coisa. Elas nos fizeram participar da sua loucura, porque não podíamos deixar de repisar seus passos, repensar seus pensamentos, e ver que nenhum deles conduzia a nós. Não podíamos imaginar o vazio de uma criatura que encosta uma navalha nos pulsos e abre as veias, o vazio e a calma. E tivemos que lambuzar nossos focinhos em suas últimas pegadas, marcas de lama no chão, malas chutadas debaixo dos corpos, tivemos que respirar para sempre o ar dos quartos em que se mataram. No final, não importa quantos anos tinham ou o fato de serem garotas, mas somente que as amamos e que elas não nos ouviram chamar, ainda não nos ouvem, aqui em cima na casa na árvore, com nossos cabelos ralos e nossas barrigas moles, chamando-as para fora daqueles quartos aonde foram ficar sozinhas para sempre, sozinhas no suicídio, que é mais fundo que a morte, e onde nunca encontraremos os pedaços para tornar a juntá-las.”